A
distância entre a tarifa e a qualidade
A distância entre o valor de
uma tarifa de ônibus, em uma cidade, e a qualidade do serviço prestado é muito
maior do que se imagina, muito além do que se deseja e propaga, pelas faixas de
rolamentos e outras faixas espalhadas pela cidade. Tarifas são calculadas pelos
reajustes dos preços de combustíveis, pelos reajustes dos acordos salariais e dissídios
coletivos da classe dos rodoviários, mais o índice de inflação em um
determinado período. E os valores de manutenção das frotas, pelas multas, impostos
e taxas; e pelas peças quebradas. Nunca pelo aumento de uma qualidade, mas sempre
pelos custos de desqualificação de uma cidade. Custos de vida e de qualidade de
vida; custos criados pelas vias e rodovias.
Estudantes sempre dão um primeiro
passo, contra o reajuste do passe, pois são justamente eles que usam o
transporte coletivo todos os dias. Avaliam um transporte com um passe livre ou pagando
meia passagem. A possibilidade de avaliar, sem necessariamente depender ou precisar
usar. E são sempre os primeiros acusados de promover manifestações e revoluções
contra o aumento de passe, um primeiro passo contra o aumento das passagens. O que
na verdade não é um simples valor de passagem, mas uma cidade oculta no valor
do passe, a omissão da prefeitura e da sociedade.
A população em frente à TV, critica
seus atos, considerados infantis ou estudantis, já que não tem coragem de levantar
da poltrona e fazer acontecer, mas beneficia-se dos resultados positivos. Cobram
inclusive outras manifestações, por outras taxas, custos e tarifas. Trabalhadores
por ganharem o vale transporte do empregador, julgam não serem atingidos com os
aumentos de passagens, e por temerem chegar atrasado para baterem o ponto não
participam, mas também são beneficiados por conquistas alcançadas.
O retrato de uma cidade está
estampado nas ruas. São as ruas que atraem os turistas. A história de uma
cidade está escrita nas ruas, com nomes de ruas, avenidas e praças; bustos e esculturas,
engenharias e arquiteturas. E a geografia de hoje faz a história que estará escrita
amanhã. Com manifestações sociais, políticas e comportamentais.
A prefeitura por sua vez
convoca e coloca forças policiais nas ruas para conter excessos nas
manifestações e facilitar o deslocamento da elite motorizada, com ar
condicionado e película no vidro, um modo de se excluir do que acontece do lado
de fora. Usam seus carros como uma blindagem social, um escudo de alguma agressão
física intencional, ou acidental, independente das manifestações. Todos os dias
fazem uma manifestação ocupando ruas e calçadas. Tiram seus carros diariamente
de suas garagens para ocupar outros espaços, dificultando o ir e vir de outros,
com o argumento de ir e vir de si.
O direito de ir e vir termina
quando o carro está estacionado. Quem deseja um carro precisa ter uma vaga de garagem
em seus pontos de partida e chegada. Colocam o seu patrimônio material como
argumento de seu suor e seu trabalho. Trabalho muitas vezes da exploração daqueles
que usam o transporte público para ir e vir, para dar lucro ao patrão ao
explorar, seu intelecto, sua produção e o seu trabalho. Automóveis não dão
chances ao pedestre ao atravessar uma pista, precisam ser flagrados, advertidos
e multados, com direito a recurso de dizer que estavam atrasados e com medo da insegurança
nas ruas; consideram-se donos de ruas e calçadas. Com seus cavalos impõem o
medo sobre os canteiros e as calçadas.
Empresário, prefeitura e
usuário são os três elementos básicos do transporte público de uma cidade, sem
o tripé não há a existência de um transporte, que deve tender a ter a melhor
qualidade. A prefeitura tem as leis, as ruas, e as calçadas, para garantir e
melhorar o sistema de transporte coletivo. Tem o poder e as regras para cobrar
das empresas, e os passageiros sempre contribuindo com o lucro e a arrecadação,
dos empresários e das prefeituras.
A qualidade de um transporte
coletivo não pode ser medida apenas pela qualidade dos ônibus e a frequência de
seus horários. O transporte começa na porta de casa, em caminho ao trabalho ou
a caminho da escola. Começa com a distância da residência ao ponto mais próximo,
começa por ter caminhos para andar e caminhos para chegar a uma parada de
ônibus, de preferência um abrigo da chuva e do Sol, uma qualidade e uma
quantidade, pelas distancias entre um ponto e outro, como atribuição da
prefeitura em estabelecer as paradas e os itinerários. Cabe a prefeitura também
estimar a população residente, estudante e trabalhadora; população de idosos e de
deficientes, de dificuldades visuais e locomotoras; conhecer seus destinos e
suas necessidades. Com dados percentuais e estatísticos estabelecer frequências
mínimas necessárias. Bem como tamanho de frotas de ônibus, com suas capacidades,
em pé ou sentados, folgados ou apertados, o direito de ir e vir dentro de um ônibus.
A prefeitura é a grande administradora de uma cidade.
Depois da partida do ônibus
vem o trajeto e as condições das ruas, asfaltadas ou com faixas exclusivas para
os ônibus, facilitando o conforto e o tempo de viagem. O empresário dono do
capital financeiro arca com o custeio da frota de coletivos, em troca de um
lucro. E a prefeitura estabelece as regras de uma licitação. Uma permissão para
explorar o sistema de transportes de uma cidade, o transporte daqueles que
movimentam a economia de uma cidade. A grande responsabilidade do custo, do
lucro e do conforto está a cargo de uma prefeitura e seus administradores, legisladores
e fiscalizadores. A administração dos tempos e dos movimentos dos cidadãos como
peças de um grande tabuleiro de um jogo, uma cidade.
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